Nunca li nenhuma obra de Günter Grass. Vi o filme baseado em "O Tambor" e é tudo. A recente confissão de que pertenceu às Waffen SS, enquanto adolescente, não me surpreende. Naquela época, era difícil escapar ao massivo recrutamento nazi, especialmente em jovens cuja doutrinação política andava pelos rudimentos do culto do Fuhrer, do III Reich e da grandeza da Alemanha. Nada que se pareça com a sofisticação demoníaca evidenciada pelo jovem personagem de "Os Malditos", de Visconti.
O que me surpreende verdadeiramente é que tenha demorado tanto tempo a desvendar a faceta "negra" da sua biografia. E que entretanto se tenha tornado a consciência moral "de esquerda" da literatura alemã. Que tenha sido um pacifista exemplar. Que tenha vociferado como poucos contra a reunificação da nação alemã.
Grass, como Saramago, como Boaventura Sousa Santos, parecem fantasmas saídos do checkpoint Charlie, em Berlim, numa pose nonchalance, sempre dispostos a justificar o injustificável, como se o mundo ainda fosse a preto e branco. O nobilizado não tinha que possuir um certificado de bom comportamento moral para entrar na história da literatura. Como li noutro lado, alguns dos maiores crápulas deste mundo também foram escritores. Mas isso não permite menorizar ou amplificar a sua obra. Até porque, como dizia José Cardoso Pires, uma das funções mais nobres da literatura é precisamente corromper. Se agora viesse a lume que Homero era um encarniçado pedófilo e praticante de cultos obscuros e vagamente sinistros, será que a Odisseia iria ser banida dos compêndios da Literatura?
Grass deu um passo à frente dos biógrafos, numa jogada de corta-fogo. Mas não se livra de ser o ex-libris de uma certa esquerda europeia, no pior que ela representa.
O que me surpreende verdadeiramente é que tenha demorado tanto tempo a desvendar a faceta "negra" da sua biografia. E que entretanto se tenha tornado a consciência moral "de esquerda" da literatura alemã. Que tenha sido um pacifista exemplar. Que tenha vociferado como poucos contra a reunificação da nação alemã.
Grass, como Saramago, como Boaventura Sousa Santos, parecem fantasmas saídos do checkpoint Charlie, em Berlim, numa pose nonchalance, sempre dispostos a justificar o injustificável, como se o mundo ainda fosse a preto e branco. O nobilizado não tinha que possuir um certificado de bom comportamento moral para entrar na história da literatura. Como li noutro lado, alguns dos maiores crápulas deste mundo também foram escritores. Mas isso não permite menorizar ou amplificar a sua obra. Até porque, como dizia José Cardoso Pires, uma das funções mais nobres da literatura é precisamente corromper. Se agora viesse a lume que Homero era um encarniçado pedófilo e praticante de cultos obscuros e vagamente sinistros, será que a Odisseia iria ser banida dos compêndios da Literatura?
Grass deu um passo à frente dos biógrafos, numa jogada de corta-fogo. Mas não se livra de ser o ex-libris de uma certa esquerda europeia, no pior que ela representa.
Publicado no jornal "O Interior"
O caso oposto dele é o do Junger. Esse sim, um grande escritor...
ResponderEliminarEu também fui escuteiro, ora essa...
ResponderEliminarSobre o mesmo assunto, o Pedro mexia tem um post deveras interessante, em
ResponderEliminarhttp://estadocivil.blogspot.com/2006/08/o-caso-grass.html
Boa abordagem, embora o caso do Peter Hanke - foi rejeitada uma peça sua em França por ter sido apoiante do Milosevic - tenha contornos bem diferentes.
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