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quarta-feira, 12 de maio de 2010

The soundbites delusion

Pelo que tenho lido em alguns locais, desde comentários nos media convencionais até ao Facebook, alguns querem reduzir a questão da espiritualidade a uma espécie de engraçadismo escolar. Ou, amparando-se na citação das headlines de autores como Richard  Dawkins, a uma colecção de máximas. Curiosamente, há cerca de dois ano e meio, fiz neste mesmo blogue um comentário alargado à sua obra mais conhecida, "The God Delusion". Na altura, publiquei também um excelente vídeo onde Dawkins expõe as suas teses sobre o assunto. Basicamente, Dawkins propõe-se desmontar a argumentação de S. Tomás de Aquino sobre a existência de Deus e as teses dos criacionistas, de que o princípio do desenho inteligente é exemplo maior. Seja como for, muitos se esquecem da obra de Dawkins até hoje mais polémica: "O Gene Egoísta". Na altura em que o li, foi uma autêntica pedrada no charco. Na sua defesa intransigente do evolucionismo, Dawkins vai muito longe, identificando-se com algumas teses do chamado darwinismo social. E sobretudo deitando por terra aquilo que tomamos como exemplos de elevação sentimental, o altruísmo dos pais em relação aos filhos, etc. De tal forma que o livro foi, na altura em que saiu, bem mais demonizado do que este. Compreende-se porquê. Abolir Deus é bem mais fácil de aceitar, numa sociedade que perdeu a noção quotidiana da transcendência,  do que a ideia de que os nossos padrões de humanidade são determinados pela competição de genes que querem produzir e ver bem sucedidas réplicas viáveis de si próprias. 
Sobretudo nas sociedades urbanas e industrializadas, a dimensão espiritual da existência é hoje crescentemente assumida enquanto construção, individual certamente, mas também personalizada. É um composto que reúne contributos plurais, mas orgenizando-os num único sentido. Esta tendência, levada ao limite, já se tornou numa caricatura consumista ou num sucedâneo da auto-ajuda. Seja como for, não é com o engraçadismo reinante (o mesmo que levou um humorista da praça a fazer um insuportável trocadilho entre a nuvem de cinzas vulcânicas e os fornos crematórios dos campos de concentração) que se deve brincar com algo simplesmente humano.

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