Com a morte de Albert Cossery, ocorrida ontem, a literatura perdeu um dos seus nomes maiores . Curiosidade ou não, também ontem e desconhecendo o facto, o escritor egípcio foi para mim longo tema de conversa. Por onde começar? A obra de Albert Cossery (1913-2008) é pouco extensa. Apologista do ócio, do desfrutar da vida no que ela tem de mais prazenteiro, foi paulatinamente construindo uma obra que prima pela total coerência. Li todos os seus livros e em nenhum senti um momento de enfado. Nota-se, prestando-se atenção, que não há frase ou parágrafo supérfluo. Apesar de se ter instalado num quarto em Paris em 1945 e de ter estado 35 anos sem regressar ao Egipto, todas as histórias dos seus livros desenrolam-se nos bairros pobres do Cairo. Os seus personagens são “os homens esquecidos de Deus”: mendigos, prostitutas, chulos, saltimbancos, ladrões (“-Escuta pequeno...Se somos pobres é porque Deus nos esqueceu, meu filho. - Deus! -, exclamou a criança. E quando se lembrará ele de nós, meu pai? - Quando Deus esquece alguém, é para sempre”.). Entre estes personagens que, esquecidos de Deus, se recusam a dar um passo para mudar a sua condição, há sempre um que é uma espécie de sábio. Aquele cuja filosofia procura sempre chamar à razão todos os que, fascinados pelo que o progresso pode oferecer, esquecem a liberdade de se não trabalhar, de não ter preocupações, de não ter responsabilidades. Quando Cossery diz que gostava que as pessoas depois de o lerem não fossem trabalhar no dia seguinte, fá-lo com toda a legitimidade, uma vez que é essa a questão que qualquer pessoa se coloca ao lê-lo. A sua filosofia é de tal maneira cativante e exposta de forma tão óbvia que não conseguimos evitar perguntar-nos para quê, porquê viver a vida da maneira que a vivemos. A arma que utiliza é sempre a mesma, o sarcasmo. Em qualquer livro seu não há instante em que ele não esteja presente. Em Portugal, as suas obras foram editadas pela Antígona, entre 1999 e 2002, incluindo uma entrevista ao autor. Uma breve recensão pode ser aqui lida.
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