Da minha participação teatral na Feira de S. João (ver aqui), na qualidade de vendedor da banha da cobra, algumas conclusões mais inclinadamente pessoais já se podem retirar:
1º Percebi a verdadeira perversidade do episódio mais emblemático de "O Perfume", de Patrick Süskind, (vd. adaptação cinematográfica de Tom Tykwer). Como se recordam, o protagonista, Jean-Baptiste, provoca um delírio colectivo na assistência, durante a gorada cerimónia pública da sua execução. Uma espécie de deliquescência erótica, uma possessão orgiástica que tomou conta de todos. Todavia, a imagem do amor que ele personificava e que contagiou o que estava em volta, era afinal uma composição metafísica, um truque. O quintessência de uma depuração gradual da necessidade, do tempo, da contingência. O resultado de uma vampirização acumulada da matéria para chegar ao espírito. Aparentemente, tudo se passou como se o brilho arrebatador que emanava do herói encontrasse eco nas pequenas chamas em redor, despertasse um sopro adormecido, o sopro da alma. O momento único em que a metáfora de desejo é também uma forma de revelação do sagrado. A fascinação é mais do que óbvia. No entanto, falta ainda um ponto essencial: a inexorável solidão do protagonista, a devoção canibalesca que suscita e que acaba por vitimá-lo. Volto ao ponto de partida, deixando de parte interpretações mais rebuscadas. Percebi o que há muito suspeitava: a verdadeira força não nasce da blindagem do ego, mas do despojamento. Não de uma alucinação mas de uma empatia. É aí que se encontra o amor sem truques. É aí que nos visita a solidão essencial. A que inspira, e já não assusta. A que nos devolve ao centro. É aí a forja onde se tempera o mais rijo aço e a mais delicada magia.
2º Por outro lado, como pude observar, quem procura a diluição numa espécie de popularidade reconfortante, acaba por se encontrar, mais cedo ou mais tarde, com o vazio primordial. E essa hora será dramática para estes praticantes da palmadinha nas costas e da conversa da treta. Pelo contrário, para bichos do mato como eu, avesso a multidões, a empatia é cirúrgica e intensa. Em resumo, digo ao que venho, bem alto, para todos, e vou-me embora. E assim, nunca chegarei a retirar o vazio portátil da mochila.
1º Percebi a verdadeira perversidade do episódio mais emblemático de "O Perfume", de Patrick Süskind, (vd. adaptação cinematográfica de Tom Tykwer). Como se recordam, o protagonista, Jean-Baptiste, provoca um delírio colectivo na assistência, durante a gorada cerimónia pública da sua execução. Uma espécie de deliquescência erótica, uma possessão orgiástica que tomou conta de todos. Todavia, a imagem do amor que ele personificava e que contagiou o que estava em volta, era afinal uma composição metafísica, um truque. O quintessência de uma depuração gradual da necessidade, do tempo, da contingência. O resultado de uma vampirização acumulada da matéria para chegar ao espírito. Aparentemente, tudo se passou como se o brilho arrebatador que emanava do herói encontrasse eco nas pequenas chamas em redor, despertasse um sopro adormecido, o sopro da alma. O momento único em que a metáfora de desejo é também uma forma de revelação do sagrado. A fascinação é mais do que óbvia. No entanto, falta ainda um ponto essencial: a inexorável solidão do protagonista, a devoção canibalesca que suscita e que acaba por vitimá-lo. Volto ao ponto de partida, deixando de parte interpretações mais rebuscadas. Percebi o que há muito suspeitava: a verdadeira força não nasce da blindagem do ego, mas do despojamento. Não de uma alucinação mas de uma empatia. É aí que se encontra o amor sem truques. É aí que nos visita a solidão essencial. A que inspira, e já não assusta. A que nos devolve ao centro. É aí a forja onde se tempera o mais rijo aço e a mais delicada magia.
2º Por outro lado, como pude observar, quem procura a diluição numa espécie de popularidade reconfortante, acaba por se encontrar, mais cedo ou mais tarde, com o vazio primordial. E essa hora será dramática para estes praticantes da palmadinha nas costas e da conversa da treta. Pelo contrário, para bichos do mato como eu, avesso a multidões, a empatia é cirúrgica e intensa. Em resumo, digo ao que venho, bem alto, para todos, e vou-me embora. E assim, nunca chegarei a retirar o vazio portátil da mochila.
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