Sobre Paulo Portas e a situação no CDS/PP já muito se escreveu na blogosfera e nos jornais. Devo dizer, antes de mais, que a situação política do partido e da direita institucional pouco me interessa. Já o mesmo não acontece com a redefinição ideológica nessa área. A minha abrangência, em termos de posicionamento político, estende-se, quando muito, até uma direita liberal que leu Tocqueville, John Rawls, Hayek e James Buchanan, o mentor da noção de "eleição pública": aqui, o problema político fundamental consiste em averiguar até que ponto o interesse particular pode ser limitado em função do bem comum, só admissível mediante um acordo derivado de uma decisão partilhada. Esta ligação umbilical entre democracia e individualismo, bem como a ideia de que, num mundo sem conflitos não haveria necessidade de delimitar direitos, procede de Hobbes. Para quem, seguramente, tal como Borges, ser conservador seria unicamente uma forma de cepticismo.
Onde aparece Portas no meio disto? Em meu entender, PP é estruturalmente um conservador pejado de atavismos procedentes da direita institucional do Estado Novo e de uma leitura apressada da modernidade. Os seus métodos ficaram patentes no período áureo do "Independente". Dispondo de uma central de informações especializada em fugas - a Procuradoria Geral da República de Cunha Rodrigues - assestou as baterias com fogo cruzado contra Cavaco Silva e seus Ministros. E conciliando um inenarrável reaccionarismo político e social com um discurso cativante e tolerante do ponto de vista dos costumes e dos comportamentos. A aposta editorial fora ganha, com todo o mérito. Mas a carreira política de PP estava ainda no seu dealbar. Depois veio o que se conhece: as várias metamorfoses e desdobramentos, dignos de um documentário sobre vida animal centrado nas técnicas de camuflagem dos polvos e cefalópodes em geral. Portas poderá ter feito a diferença. Portas poderá ser a figura política incómoda, por estar fora da conveniente arrumação partidária, como diz VPV. Mas não deixará nunca de ser aquilo que sempre foi: um conservador com tiques cabotinos. Como exemplo, a reacção despropositada que tomou em relação à participação de Maria José Morgado num debate sobre o aborto, durante a campanha do referendo. E que na altura tive oportunidade de comentar. No entanto, o seu regresso à política activa, depois do banho de "saber" evidenciado no programa " O Estado da Arte" ( o próprio título é suspeito), tem inegáveis vantagens. Por um lado, poderá elevar a intensidade (não a qualidade) do debate político. Por outro, satisfará a minha curiosidade sobre qual será a sua próxima metamorfose.
Sim,mas não convém menosprezá-lo.
ResponderEliminar