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sábado, 10 de fevereiro de 2007

Passeando na blogosfera - 7

Na sua crónica publicada na revista "Atlântico", Carla Quevedo elege O Jansenista como o melhor blogue português da actualidade. Quase sempre tenho seguido as observações e indicações da autora nessa sua coluna, em que a blogosfera é o tema dominante. Fui então verificar in loco a justeza da apreciação. A primeira pergunta que dirigi a mim próprio foi "O que é um jansenista?". Fui então à Wikipédia obter o devido esclarecimento. Trata-se do adepto de uma teologia cristã que surgiu em França , no século XVII e desenvolvida no seguinte: o jansenismo. E que o nome se deve à sua origem nas ideias do bispo de Ypres, Cornelius Jansen. Basicamente, era uma versão modificada do calvinismo, que por sua vez se baseia na teologia de Agostinho de Hipona. Muito bem. Suspeito fortemente que M. de Sainte Colombe, o conhecido mestre de viola da gamba celebrizado no filme "Tout les Matins du Monde" também era jansenista.
Passemos então à degustação. O autor gosta de partilhar os seus gostos musicais, quase sempre no domínio do Jazz e da música erudita, os literários (propondo obras no original) e algumas sugestões de turismo cultural. É claro que o bom gosto predomina. As citações, algumas no vernáculo original, são irrepreensíveis. A polémica é elegante e a previsibilidade está ausente. Mas é em alguns artigos de opinião que o autor se revela um verdadeiro livre-pensador. Embora não conseguindo disfarçar alguma arrogância, que passa por meneios de estilo. Mas o todo é muito mais mais do que a soma das partes. O que significa que, sendo coerente ao nível das escolhas, por sua vez alcançou, por direito próprio, uma distinção que não cessa de surpreender.

5 comentários:

  1. Gil

    A definição da Wikipédia, que não li, deixa muito a desejar. Embora haja muito de submissao total ao mistério de Deus e da vontade divina, o jansenismo está no pólo oposto do calvinismo porque defende a submissão total à tradição católica. Que é um vento de liberdade dentro da Igreja católica, di-lo o exemplo de Pascal, cuja irmã era monja no Convento de Port-Royal, o centro do jansenismo. Costumam comentar os entendidos que, porque a França preferia submissão da sua Igreja católica ao Rei ( tempo de Richelieu) em vez de submetida a um Papado nas mãos dos Habsburgos rivais, o jansenismo evitou justamente o Protestantismo em França.

    Se quiseres saber também por curiosidade, a discussao agostiniana, revivida pelo Jansenismo, de que se Deus é Deus o Homem não tem liberdade mas apenas livre-arbítrio, foi ultrapassada em Lisboa, com a publicação de João de Mariana, do texto em que se defendia o princípio da Liberdade suficiente. Quer dizer, o Homem tinha uma liberdade suficiente para se salvar ou condenar, mas, no geral, Deus era Senhor da História e do caminho para a Salvação.

    O autor do Blogue a que te referes, embora se diga Jansenista, é na verdade um corente e informado Kantiano, sendo Kant na sua juventude, e sua mãe, pietistas, que eram protestantes. O pietismo tem uma das suas expressões, além do rigor e da honestidade de Kant ( o que lhe não tira a profunda e quase pagã secura) no actual movimento -- que muito admiro -- dos Amish.

    André

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  2. Gil,

    Esqueci-me duma coisa engraçada que me faz ter sempre uma grande ternura por Kant e, ao mesmo tempo uma distância das suas teorias: pietismo e jansenismo, em dois campos diferentes, tiveram os mesmos resultados; Enquanto os jansenistas se inclinaram perante o Papa mas passaram a dizer "muito do que o Papa diz, entra-me por um ouvido e sai-me por outro", os pietistas passaram a dizer o mesmo em relação aos reis, que substituiram os Papas, entre os protestantes. Contra fanáticos católicos ou soldadesca protestante, os pietistas evitaram formar uma nova Igreja e os Jansenistas evitaram formar uma nova Ordem ou seita.

    Acho que a atitude dos pietistas Amish foi um pedaço de Céu neste mundo tão violento; Quando qauele desesperado lhes matou as miúdas, a primeira coisa que foram fazer foi uma colecta para a família das vítimas e para a família do assassino. E, mais uma vez, renunciaram às armas, aos telefones móveis, aos carros de segurança velozes.

    Um dia sonhei ser Amish, talvez um dia realize esse sonho.

    André

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  3. André:

    Isso sim, seria uma bela e respeitável utopia.

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  4. Gil,

    Os Amish não são uma utopia. Sao uma realidade bem viva, que recusa certos vícios tecnológicos modernos, para cerca de 200.000 americanos e muitos mais na Europa, América do Sul e Rússia, pela versão da Igreja Menonita, menos visível. Além do seu rigoroso pacifismo, e de, quando são mais de cem, desandarem a fundar outra comunidade,como sempre, governada por quatro patriarcas, são completamente contra o aborto e, diz-se que só numa coisa pecam: por mais suaves e pacientes que sejam, quando excomungam ( era essa força da fé pietista de Kant) são duma irreversibilidade implacável. Por isso, acho que ser Amish é um sonho, para um católico apostólico romano, mesmo dos fraquitos.

    Não te esqueças do que te disse no e-mail, fazes favor.

    André

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  5. André, vais ter que me reenviar esse email, pois não recebi nada.

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