Ao contrário do que vem nos manuais de História e do que pensa a intelectualidade sub-gaulesa que ainda sobrevive no nosso País, em termos de liberdade (ou liberdades) nada devemos à Pátria de Descartes e Lamartine. Refiro-me às liberdades civis, e sobretudo o seu núcleo mais importante, as liberdades negativas, tais como ainda hoje são vertidas nos textos constitucionais. E ainda ao Estado laico, à separação dos poderes e mútuo controlo. Numa associação simplória de causa-efeito, fez-se descender estas conquistas directamente da Revolução Francesa. Mais concretamente da célebre Declaração de Direitos. Não creio de todo que assim seja. A liberdade, tal como hoje é entendida e vivida, é um epígono da Kant, quando lhe retirou as vestes teleológicas, mas sobretudo do parlamentarismo inglês e da Revolução Americana. No primeiro caso, a lição de as liberdades nunca poderem ser impostas de cima, mas organicamente consolidadas. Em defesa do indivíduo, naturalmente, mas também condição da sua cidadania. No segundo, temos um bom senso de pequenos proprietários, num momento histórico em que a tecnologia ainda não tinha separado irremediavelmente o homem da compreensão e do domínio de facto dos objectos com que lida no seu dia a dia. Um bom senso que erigiu um sistema de poderes que se fiscalizam mutuamente e que da política retirou o fundamental: os factos resultam da acção e não de intenções. Sobre eles rege a lei e nada mais.
Para uma melhor percepção deste entendimento, dirigi-me à Sé, onde observei, mais uma vez, os danos causados no retábulo pela soldadesca napoleónica na 1ª Invasão. Falo de destruição gratuita, que nada acrescentou. Um acto de selvajaria , a vis dos conquistadores que, em nome da ambição de um homem, pela força das baionetas quiseram impor a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Uma coisa ficou, no entanto: o Code Civil napoleónico, que inspirou toda a legislação oitocentista europeia no domínio do direito privado. Por cá, em particular o Código de Seabra, de 1867, que vigorou um século.
Para uma melhor percepção deste entendimento, dirigi-me à Sé, onde observei, mais uma vez, os danos causados no retábulo pela soldadesca napoleónica na 1ª Invasão. Falo de destruição gratuita, que nada acrescentou. Um acto de selvajaria , a vis dos conquistadores que, em nome da ambição de um homem, pela força das baionetas quiseram impor a liberdade, a igualdade e a fraternidade. Uma coisa ficou, no entanto: o Code Civil napoleónico, que inspirou toda a legislação oitocentista europeia no domínio do direito privado. Por cá, em particular o Código de Seabra, de 1867, que vigorou um século.
Gil,
ResponderEliminarAntes de mais, parabéns pelo teu Blog. Vê la não lhe faças um IVG.
Vê lá tu, que o Pen Club nomeou para o Premio Nobel da Literatura os nossos dois heróis, o Herberto Hélder e o Ramos Rosa...que ganhe o melhor, o Rosa é claro.
Sobre este Post deixa-me fazer-te um aviso de quem, desde pequeno era chamado o filósofo e que tentou estudar filosofia, sem grande êxito académico, mas como quem procurava realmente uma chave para as coisas: não caias no erro, de substituir o TGV Revolução francesa-Marxismo-Ecologia pelo Airbus Kant-Democracia-Conservadorismo compassivo. Devo-te dizer que os drogados e trapaceiros de Lisboa já o fizeram há pelo menos vinte anos e tem sido uma solução valente para os Possessos de Dostoievsky que se dizem hoje de Esquerda democrática escondendo uma vida de orgias, droga, abortos e dissipação da fortuna dos papás.
Basta leres um bocadinho para trás e saberes que a divisão de Poderes foi feita por um aristocrata Montesquieu ( daí o equilíbrio não democrático de Poderes) e que a Revolução americana não foi inspirada pelos ingleses ( que tinham superado dialecticamente os Stuart e o sanguinário Cromwell, com a dinastia de Orange) mas justamente pelos franceses, sem cujo apoio logístico, Washington nunca teria vencido o maior exército do Mundo. Sim, a Liberdade de que tu gostas é francesa e Kant disse que morria feliz porque tinha visto a Revolução francesa. E francesa é porque não precisou de se tornar luterana, graças a Pascal e ao Jansenismo ( Kant era pietista, versão alemã do jansenismo).
Sim a liberdade em que tu acreditas é provavelmente uma liberdade finalmente triste, depois de muita euforia, uma liberdade sem sentido apesar de todo o fogo de artifício de Voltaire. É isso o iluminismo, a fotopatia. Dizeres que a Revolução americana, iniciadora do maior holocausto da História, o dos indios, é de pequenos proprietários onde só manda a Lei, é ignorar o que não queres ver: Hiroshima e Nagasaki, a Primeira Guerra Mundial, Versalhes, Hitler Estaline e Mao Zedong, o século dos massacres mundiais.
Só te lembro o que citaste de Nietzsche, quando o sentias, um dia, quando todos nós éramos melhores " Kant é um velho tartufo".
Sim Gil, o que viste no retábulo da tua Sé, onde talvez um velho levanta e pousa cálices, repetindo uma ladainha inútil, foi um gesto do bom selvagem... do Rosseau e do Robespierre franceses? Não, Gil, do "bom" selvagem americano, do novo mundo...
Talvez um dia compreendas porque é que o menino Hitler passou a infância toda a brincar aos índios e aos cowboys, sendo sempre índio. Montezuma antes de morrer, apesar de ter pago o resgate disse: a coca fara o índio forte e destruirá o homem branco. Olha à tua volta.
André
André:
ResponderEliminarObrigado pelo cumprimento em relação ao blogue.
Quanto ao comentário, acho que exageras bastante, extrapolando o objecto da postagem. Além disso colocas as coisas num prisma de ordem moral. Como esse não é o meu terreno, e como as nossas diferentes posições em relação a determinados comportamentos são conhecidas, ficarei por aqui. Só uma coisa: para mim, liberdade significa também co-existência de crenças e convicções morais, sem que nenhuma se imponha às outras. É capaz de ser pouco excitante, mas pelo menos preserva-nos de tentações totalitárias.
Gil,
ResponderEliminarPor isso mesmo. Não podes uniformizar tudo. Tens de admitir coisas com formas e dimensões diferentes e outras até, inexplicáveis, como a matéria na Física quântica. Por isso mesmo. O totalitarismo nasceu da Democracia.
De resto o que te disse nada tem de moral, ao que me parece. Tem de História do Pensamento e de Filosofia.
Mete-te medo a palavra? Pronto, eu uso Ética. A propósito de Homem Moral: sabes que De Gaulle foi o único Presidente francês a quem não se conhecem ter tido amantes? Já dizia Rommel que o perigo mortal acaba com as ideias fixas.
André
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ResponderEliminarOlá, Gil
ResponderEliminarA tríade a que te referes é da autoria de Louis Claude de Saint-Martin, discípulo de um português, Pascoal Martins, judeu, cabalista e maçon. Pela leitura de Victor Hugo e de Sampaio Bruno, há bons motivos para crer que, na tríade, a Liberdade e a Igualdade representam o Direito (Din ou Geburah), e a Fraternidade, o Amor (Hesed), que são duas sefiras da árvore sefirótica, harmonizadas, no triângulo intermediário da árvore sefirótica, pela Beleza (Tipheret), Metraton, o Anjo da Face, Cristo, Deus, em suma. Temos, realmente, dificuldade em fugir-Lhe.
Talvez não devamos tanto como se pensa à pátria de Lamartine, mas devemos alguma coisa a uma tradição mística, neste caso a do Judaísmo, que, desde cedo, talvez desde os fiéis-do-Amor, permeou a Maçonaria, mesclando-se com o esoterismo cristão. O que disto resultou, o Socialismo, é pura refracção da Luz.
Olá Pedro, sejas bem aparecido.
ResponderEliminarÉ claro que, sobre o tema que referes, estás muito melhor informado que eu, pois só tenho algumas referências sobre a história da maçonaria de Lyon. E mesmo a Revolução Francesa, considero-a um marco histórico inspirador. Nela destacando Saint-Just, o mais esclarecido. Que, obviamente,foi a causa directa de toda a turbulência liberal ao longo do séc. XIX e até à I Guerra.
Gil,
ResponderEliminarGosto de te ouvir falar assim. Já mo dizias na Universidade. Saint-Just foi um bom homem, concordo.
André
De qualquer maneira, é bom que fique claro que sou avesso ao hermetismo, porque anacrónico hoje em dia. E porque prefiro de longe a poesia à metapoesia para iniciados. De resto, nada altero, antes pelo contrário, ao que está no post.
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