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segunda-feira, 18 de setembro de 2006

Falsos ídolos - 3

Para melhor compreender as recentes declarações do Papa sobre o Islão, leia-se este post. Brilhante e esclarecedor, sem dúvida. Mesmo que se trate de uma tempestade num copo de água. No entanto, o texto suscita alguns apontamentos.
Antes de mais, devo dizer que as minudências teológicas me escapam completamente. Em matéria de religião, sou agnóstico. Com uma enorme simpatia pelo budismo. Precisamente porque não é uma religião convencional, com uma galeria de deuses, imposições, códigos de conduta, espectros, medos, castigos, dualidades, algo que nos infantiliza a ponto de a oração se resumir a pedir prendinhas ao Pai Natal. Encaro-o mais como uma filosofia, uma prática, onde se exige tudo do próprio, e a vida se reduz ao que ela é: uma relação permanente, mas transitória, de causa-efeito. De qualquer forma, depois de ler o "Tratado de História das Religiões" de Mircea Eliade, percebi que, do ponto de vista antropológico, a religião é um fenómeno poderoso. Mas que não esgota, nem de perto nem de longe, a verdadeira espiritualidade. Que pode também ser encontrada na arte, no erotismo, na contemplação da natureza, na meditação, ou no consumo de determinados alucinogéneos. Aliás, veja-se a recente tentativa de reatar a discussão sobre o creacionismo por parte da Igreja. Só esta aberração diz bem do estado a que chegaram as coisas. Sem retirar a inefável qualidade literária à história de Adão e Eva, é claro.
Quanto ao radicalismo islâmico e luta anti-terrorista, as minhas posições são conhecidas: tolerância zero. Subtilmente, o texto transmite a ideia de que o Ocidente é o agressor e de que a Jihad é justificável num contexto de auto-defesa. A tal inversão da vítima e do carrasco de que falei aqui outro dia. Ora este pensamento é inaceitável. Será que já se esqueceram do 11 de Setembro? O amor que é referido no post é algo respeitável. Mas de que amor se fala? Aos terroristas também é fornecida uma galeria de inimigos para liquidar a ainda se amarem por isso. É em nome do amor que querem destruir a nossa civilização. E em nome de Deus, ainda por cima. Com cobertura nos complexos de culpa coloniais ainda presentes no Ocidente, nos idiotas de serviço que estão em todas, num anti-americanismo primário que parece ter revigorado a esquerda cataléptica pós queda do muro de Berlim. Deus pode ser Razão para os verdadeiros crentes. Mas não duvidem que, para estas turbas de fanáticos, Deus é somente uma conveniência segura para exerceram o seu ódio e a sua sede de poder.

Ver anterior

3 comentários:

  1. Sim, parece que a esquerda incorporou o ódio à diferença e à verdadeira vitalidade interior de que durante tanto tempo foi vítima. Em relação a fundamentalismos, é bom não esquecer que do lado de cá também há seitas e uma coisa tenebrosa chamada Opus Dei. Que recrutam orfãos, metem-nos a trabalhar como escravos, sem quaisquer direitos e fazem-lhes autenticas lavagens ao cérebro. Também en nome de Deus, claro está.

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  2. Gil,

    Quando tiver um pouco mais de tempo, vou tentar falar um bocadinho sobre isto. Sempre tendo em conta aquela frase do Dalai Lama, que podemos perder tudo o que cuidadosamente amealhámos, num repente de fúria.

    André, sem buço

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  3. André:

    Estou sempre disposto a escutar e ao diálogo. Especialmente com pessoas com quem, como tu, embora divergindo em certos aspectos, me merecem toda a consideração.

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