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terça-feira, 1 de setembro de 2009

O nó

Aplaudo sem restrições o veto presidencial ao projecto-lei de regulamentação das uniões de facto, aprovada recentemente pela maioria parlamentar. Se há matéria sobre a qual sou sensível é a da invasão da esfera das liberdades pessoais por uma esquerda festiva e que utiliza a sua ideia de igualdade como um rolo compressor. Neste caso, um PS em fim de mandato, acolitado pelos comunistas e pelas hordas fracturantes bloquistas, não hesitou em tentar fazer passar pela porta do cavalo algo que a sociedade nunca reclamou, nem o seu programa eleitoral mencionou. Esta medida tem duas leituras óbvias. A imediata, diz-nos que o timing para uma eventual reaprovação parlamentar da lei irá recair na próxima sessão legislativa. Com a decorrente incerteza da próxima composição parlamentar. O PS quer assim demonstrar trabalho perante a esquerda "histórica" e marcar pontos nas eleições que se avizinham. Por sua vez, uma leitura não imediata revela-nos a profunda insensatez deste tipo de medidas. Repare-se no seguinte: a recente lei do divórcio veio instituir, na prática, uma espécie de permissão para o "divórcio na hora", desprotegendo, nos seus efeitos, a parte tendencialmente mais fraca. Isto é, conseguiu relativizar os deveres e exponenciar ficticiamente os direitos. Com a recente proposta, vem-se atribuir efeitos jurídicos a uma situação de comunhão de vida, onde as partes não quiseram precisamente que eles existissem! Porque se realmente os quisessem tinham optado pelo casamento! Ou seja, o Estado, munido do característico jus imperii, vem meter no mesmo saco situações inconfundíveis, determinadas exclusivamente pela esfera de liberdade pessoal dos envolvidos. Criando assim uma espécie de casamento atípico, onde são atribuídos direitos a quem nunca os pediu e negados os deveres que os justificam. A esquerda jacobina deve estar orgulhosa desta "obra" proselitista! De uma estupidez inaudita. Até porque as situações injustas criadas por via das uniões de facto, do ponto de vista securitário, da transmissão do arrendamento e sucessório, já estavam devidamente salvaguardadas no ordenamento jurídico em vigor. É quanto basta. Tudo o mais é uma intromissão intolerável na privacidade dos cidadãos. Por outro lado, há quem defenda que o projecto agora vetado vem trazer alguma protecção aos casais homossexuais. Mas se assim é, então mais valia que a maioria parlamentar assumisse, corajosa e frontalmente, o casamento entre nubentes do mesmo sexo! Porém, essa medida é pouco "aconselhável", em termos de contabilidade eleitoral. Ora bem... Mais interessante foi ver a reacção de alguns parlamentares ao veto presidencial: "arcaico", "ultra-conservador", "reaccionário", que "quer manter a injustiça", etc. Sem um único argumento razoável em defesa do projecto. Só faltou o providencial grito de guerra da "esquerda unida, sa": "seu façista!". Em resumo, didáctico, mas de uma tristeza aterradora.

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