O Manuel Domingos lançou-me novamente as argolas de outra corrente literária. Nesta, o motivo é a poesia. Já agora, será que haverá outro? O móbil do crime, diz quem lançou a ideia, é que "serão retiradas das pilhas periclitantes que se derramam atrás das portas, encostadas às paredes, aquelas pequenas gotas de alma que ficam connosco, mesmo quando nos esquecemos delas." Pois bem, não é que tenha lido muita poesia nos últimos tempos. Prefiro vivê-la e registá-la. Mesmo assim, escolhi para a ocasião um texto particularmente luminoso de António Ramos Rosa. E o Manuel vai-me perdoar mas não vou acorrentar mais ninguém.
Uma cidade amadurece nas vertentes do crepúsculo
Há um íman que nos atrai para o interior da montanha.
Os navios deslizam nos estuários do vento.
Alguma coisa ascende de uma região negra.
Alguém escreve sobre os espelhos da sombra.
A passageira da noite vacila como um ser silencioso.
O último pássaro calou-se.As estrelas acenderam-se.
As ondas adormeceram com as cores e as imagens.
As portas subterrâneas têm perfumes silvestres.
Que sedosa e fluida é a água desta noite!
Dir-se-ia que as pedras entendem os meus passos.
Alguém me habita como uma árvore ou um planeta.
Estou perto e estou longe no coração do mundo.
Uma cidade amadurece nas vertentes do crepúsculo
Há um íman que nos atrai para o interior da montanha.
Os navios deslizam nos estuários do vento.
Alguma coisa ascende de uma região negra.
Alguém escreve sobre os espelhos da sombra.
A passageira da noite vacila como um ser silencioso.
O último pássaro calou-se.As estrelas acenderam-se.
As ondas adormeceram com as cores e as imagens.
As portas subterrâneas têm perfumes silvestres.
Que sedosa e fluida é a água desta noite!
Dir-se-ia que as pedras entendem os meus passos.
Alguém me habita como uma árvore ou um planeta.
Estou perto e estou longe no coração do mundo.
in A Rosa Esquerda (1991)
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