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sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

O fogo que arde

O ano passado pelo Outono, durante um fim-de-semana, frequentei uma acção de formação na Universidade do Minho, em Braga. O tema eram as novas funcionalidades da web 2.0. Mas o assunto trazido para aqui é outro. Aproveitei a ocasião para uma escapada a Ponte de Lima, um lugar predilecto do escriba. Com passagem pela capela visigótica de S. Frutuoso e o magnífico Mosteiro de Tibães. Este último, um edifício imponente, que se destaca na clássica paisagem minhota em redor, foi recentemente objecto de obras consideráveis de reabilitação. Na área adjacente, destaco um fontanário em rocaille com um enorme reservatório circular, a área agrícola com o milheiral, várias pequenas fontes e um modesto mas fresquíssimo jardim desenhado "à francesa". Este rodeado das proverbiais vinhas em enforcado, frondosos carvalhos e castanheiros. Tudo condimentos mais do que suficientes para um amante das paisagens bucólicas, como é o caso do escrevente, se perder por umas largas horas. Mas vamos ao que interessa. O mosteiro, fundado no séc. XII, destacou-se precisamente por ter sido a casa mãe da próspera Ordem Beneditina. Até à sua venda, em 1834, por via da extinção das ordens religiosas ocorrida naquele período. O claustro principal, logo à entrada, notabiliza-se pelos painéis de azulejos ao longo das paredes. Os quais relatam os episódios mais marcantes da vida do santo fundador da ordem, S. Bento. Alguns desapareceram ou estão incompletos, fruto de actos de vandalismo. Todavia, um deles destaca-se pelo episódio nele relatado. A história é simples: certo dia, no meio das austeridades próprias da sua vida de eremita, o santo deparou-se com uma rapariga banhando-se num rio que ali passava. A qual, como se adivinha, nem mesmo o trapinho que figura no painel tinha para se cobrir. O santo homem deve ter logo rezado uns valentes Pai-Nossos e Avé-Marias, com alguns actos de contrição pelo meio e esconjuros avulso. Mas a solução não parece ter resultado. O vade retro para esta aparição demoníaca exigia medidas radicais. Pois bem, dito e feito. O santo dirigiu-se a um matagal de... urtigas. Onde se mortificou demoradamente, esperando assim que o ardor da planta extinguisse outros fogos. E é precisamente no meio das urtigas que S. Bento foi representado para a posteridade. Preservado das tentações e envolto numa espécie de pudicícia vegetal. Há imagens que valem mesmo mais do que mil palavras. Ou então, mais do que dois mil anos de história.

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