Era uma vez um senhor chamado Jorge Viegas Vasconcelos. Era presidente de uma coisa chamada ERSE: Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos. Um sítio misterioso, que praticamente ninguém conhece. E, dos que conhecem, poucos devem saber para o que serve. Mas o que sabemos é que o senhor Vasconcelos pediu a demissão do seu cargo. Mas porquê? Segundo consta, queria que os aumentos da electricidade ainda fossem maiores. Ora, quando alguém se demite do seu emprego, fá-lo por sua conta e risco. O que significa que não lhe é devido, pela entidade empregadora, qualquer tipo de indemnização, ou compensação. Porém, com o senhor Vasconcelos não foi assim. Na verdade, ele vai para casa com 12 mil euros por mês - ou seja, 2.400 contos - durante o máximo de dois anos, até encontrar um novo emprego. Aqui, quem me lê pergunta, ligeiramente confuso ou perplexo: «Mas você não disse que o senhor Vasconcelos se despediu?». «Pois disse. Ele demitiu-se, isto é, despediu-se por vontade própria!». E volta a questão: «Então, porque fica o homem a receber os tais 2.400contos por mês, durante dois anos? Qual é, neste país, o trabalhador que se despede e fica a receber seja o que for?». Se fizermos esta pergunta ao ministério da Economia, ele responderá, como já respondeu, que «o regime aplicado aos membros do conselho de administração da ERSE foi aprovado pela própria ERSE». E que, «de acordo com art. 28º dos Estatutos da ERSE, os membros do conselho de administração estão sujeitos ao estatuto do gestor público em tudo o que não resultar desses estatutos». Ou seja: sempre que os estatutos da ERSE foram mais vantajosos para os seus gestores, o estatuto de gestor público não se aplica. Dizendo ainda melhor: o senhor Vasconcelos (que era presidente da ERSE desde a sua fundação) e os seus amigos do conselho de administração, apesar de terem o estatuto de gestores públicos, criaram um esquema ainda mais vantajoso para si próprios, como seja, por exemplo, ficarem com um ordenado milionário quando resolverem demitir-se dos seus cargos. Com a bênção avalizadora, é claro, dos nossos excelsos governantes. Para além de uma ilegalidade mais do que duvidosa, trata-se de uma afronta a milhões de portugueses, que sobrevivem com ordenados baixíssimos e subsídios de desemprego miseráveis. Em suma, mais uma parcela no extenso rol do abusivo e desavergonhado abocanhar do erário público. Mas voltemos à nossa história. O senhor Vasconcelos recebia 18 mil euros mensais, mais subsídio de férias, subsídio de Natal e ajudas de custo. 18 mil euros seriam mais de 3.600 contos, ou seja, mais de 120 contos por dia, sem incluir os subsídios de férias e Natal e ajudas de custo. Aqui, uma pergunta se impõe: Afinal, o que é - e para que serve - a ERSE? A missão da ERSE consiste em fazer cumprir as disposições legislativas para o sector energético. E pergunta o leitor, mais uma vez: «Mas para fazer cumprir a lei não bastam os governos, os tribunais, a polícia, etc.?». Parece que não. A coisa funciona assim: após receber uma reclamação, a ERSE intervém através da mediação e da tentativa de conciliação das partes envolvidas. Antes, o consumidor tem de reclamar junto do prestador de serviço. Ou seja, a ERSE não serve para nada. Ou serve apenas para gastar somas astronómicas com os seus administradores. Aliás, antes da questão dos aumentos da electricidade, quem é que sabia que existia uma coisa chamada ERSE?
Sem comentários:
Enviar um comentário