aqui está o fogo, bebe. aqui estão as estrelas cujos nomes alguém inscreveu a sangue. aqui está a terra onde me sepultarás. longínquos dias, travessia de séculos, noites perdidas na inutilidade irrequieta dos quartos-minguantes. aqui estou, perdido para sempre, sozinho, quase sem mim, a evitar o pior. pego num cigarro, fumo-o sofregamente. desejo-te ainda. se o telefone tocasse, se batessem à porta, se me apetecesse sair daqui. já não estou contigo nem com os outros. eles estão vivos, movimentando-se. eu não sei se estou vivo, imobilizo-me. os cães ladram junto à janela, ouço-os cada vez mais longe.
Al Berto, in "O Medo", Livro X, 1985