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segunda-feira, 3 de setembro de 2007

A cegueira

Li há pouco o livro de memórias de Maria Filomena Mónica, intitulado "Bilhete de Identidade". Aparte o comentário à obra, que ficará para outra altura, detive-me num episódio relatado na página 325. No início do "Verão quente", em Maio de 1975, Jean-Paul Sartre foi fotografado a empunhar uma G-3 à entrada do Ralis, o celebrizado quartel general dos SUV (Soldados Unidos Vencerão) e onde teve lugar o famoso juramento de bandeira com o punho erguido. O chamado turismo revolucionário estava no auge. Todos os dias desembarcavam em Portugal resmas de artistas e intelectuais franceses com a ressaca do Maio de 68, deslumbrados com uma revolução doce e portátil. Touraine, Cohn-Bendit, Althusser e outros andaram por aí, tentando perceber porque é que um sopro mais forte fez ruir um regime ditatorial. E também comprovar, no convívio com o povo "genuíno" e os seus ainda mais "genuínos" intérpretes, a validade do seu pensamento engagé. Nesta altura, o marxismo era tema obrigatório, mesmo nas Universidade mais conceituadas. Poucos eram os intelectuais "de esquerda" que ousavam criticar o "socialismo real" praticado a Leste, apesar da Hungria e da Primavera checa. A simpatia de alguns iconoclastas ia para... a revolução cultural chinesa. A linhagem de Sartre provem de Breton, Aragon, Éluard, Malraux. Todos eles fascinados com Estaline e as delícias dos planos quinquenais. Nunca se ouviu das suas bocas a mais leve alusão aos kulaks. Que descansem em paz.

2 comentários:

  1. Por cá, a linhagem continua no Saramago.

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  2. Parece que o Aragon emendou a mão... Quanto ao Saramago, veio dizer que as Farc é uma organização terrorista. Custa a acreditar, mas é verdade...

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