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terça-feira, 1 de maio de 2007

Diálogos imaginados


Francis Ponge, Douze petits écrits,

Francis Ponge:
- «O que daria uma destilação do Mundo?», perguntava, maravilhado, um homem, ébrio pela primeira vez.
O que se maravilhou com a frase:
- E o que daria uma destilação franca da Arte?
Francis Ponge:
- Suponha que os pensamentos são balões; o ansioso até nestes se poderá cortar.
O que se maravilhara com a frase, ressacado, ansioso, ressentido:
- Que daria – então – uma destilação de frases como estas, tuas?
Francis Ponge:
- Para compreender, a inteligência tem de se sujar. Antes de tudo, antes até de se sujar, tem de ser ferida.
Com um grande lenho na inteligência provocado por um balão, já sóbrio, o outro:
- O que eu sei é que textos e textos de uvas secam neste momento na videira. O que a minha ignorância me revela é que a leitura que se pratica por aí é um sulfato que se aplica a um fruto que não sofre o esventramento dos dentes, nem a degustação - quanto mais a destilação paciente, constante, o apuro que inebria os gestos e os modifica...
Francis Ponge:
- Os eternos distraídos que se ocupem de distracções...
O outro, já só por brio:
- Não te entristece este entulho todo – a imagem, a aspirina, a cultura – que todo o texto converte em entulho? Não te entristece a inutilidade das tuas frases fulgurantes?
Francis Ponge:
- Sonho cavalar: o cavalo, depois de comer a carroça, contempla o horizonte.
O outro:
- Um demónio te ouça!

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