Pedro Magalhães publicou recentemente no "Público" um artigo onde, a propósito de uma sondagem realizada sobre a despenalização do aborto, chama a atenção para a motivação contraditória da resposta fornecida pelos inquiridos numa sondagem. O texto está disponível no "Outras Margens". Tendo como ponto de partida a obra "The nature and origins of mass opinion", de John Zaller, PM desenvolve uma ideia, a meu ver, deveras acertada: "a maior parte das pessoas não tem verdadeiras opiniões seja sobre o que fôr". Em vez disso, dispõem abundantemente de predisposições e considerações. Como é sabido, já os gregos desvalorizavam a opinião. Platão opõe a crença ou opinião ("doxa", em grego) ao conhecimento. A crença é um determinado ponto de vista subjectivo. O conhecimento é crença verdadeira e justificada. Não sei se foi com base neste postulado epistemológico que o autor chegou à conclusão referida. Certo é que, ao estabelecer-se uma dualidade - como fez Platão - a finalidade mais óbvia é a desvalorização de um dos termos da comparação. Neste caso, a "doxa". De qualquer modo, o preconceito subsistiu, assumindo uma relevância suplementar no caso dos estudos de ... opinião.
Centremo-nos nas duas categorias referidas. Segundo PM, predisposições são "crenças e valores muito genéricos, tais como o igualitarismo, o individualismo ou os sentimentos de identificação com os interesses de um grupo", que revelam sérias dificuldades de conversão linear numa tomada de posição face a uma questão concreta. As considerações, por sua vez, são "argumentos a favor ou contra uma determinada posição, que vão sendo recolhidos pelos indivíduos através da exposição aos meios de comunicação social." O autor chama a atenção para a existência de considerações "de sinal oposto" nos media, o que é natural em sociedades abertas. No entanto, no momento em que o inquirido emite a sua escolha, esta é determinada por factores conjunturais: a forma como a questão é colocada, o "animus" do inquirido, a forma mais ou menos impressiva como entrou em contacto com desenvolvimentos recentes respeitantes ao assunto em causa, etc.
Ora, o aborto é um tema em que as respostas não são, por regra, lineares. Está em causa a forma como o Estado irá regular a esfera pessoal dos cidadãos. Aqui, as opções de regulação, de que fala PM, "não se medem em quantidades e os interesses envolvidos são difusos." Trata-se, sobretudo, de valores fundamentais que "podem ser defendidos ao mesmo tempo pela mesma pessoa". Sendo que a ciência ainda não deu resposta a algumas questões que poderiam atenuar os diferendos ao nível da opinião pública. Eis pois um caso paradigmático, onde as considerações expostas no texto citado têm um vasto campo de aplicação.
Centremo-nos nas duas categorias referidas. Segundo PM, predisposições são "crenças e valores muito genéricos, tais como o igualitarismo, o individualismo ou os sentimentos de identificação com os interesses de um grupo", que revelam sérias dificuldades de conversão linear numa tomada de posição face a uma questão concreta. As considerações, por sua vez, são "argumentos a favor ou contra uma determinada posição, que vão sendo recolhidos pelos indivíduos através da exposição aos meios de comunicação social." O autor chama a atenção para a existência de considerações "de sinal oposto" nos media, o que é natural em sociedades abertas. No entanto, no momento em que o inquirido emite a sua escolha, esta é determinada por factores conjunturais: a forma como a questão é colocada, o "animus" do inquirido, a forma mais ou menos impressiva como entrou em contacto com desenvolvimentos recentes respeitantes ao assunto em causa, etc.
Ora, o aborto é um tema em que as respostas não são, por regra, lineares. Está em causa a forma como o Estado irá regular a esfera pessoal dos cidadãos. Aqui, as opções de regulação, de que fala PM, "não se medem em quantidades e os interesses envolvidos são difusos." Trata-se, sobretudo, de valores fundamentais que "podem ser defendidos ao mesmo tempo pela mesma pessoa". Sendo que a ciência ainda não deu resposta a algumas questões que poderiam atenuar os diferendos ao nível da opinião pública. Eis pois um caso paradigmático, onde as considerações expostas no texto citado têm um vasto campo de aplicação.
boa malha, Gil.
ResponderEliminarHá duas outras categorias usadas em abundância:
ResponderEliminar1º a suposição ("eu não vi/fui/li, etc., mas"...seguindo-se duas horas de alegações
2º a premonição ("estou com um pressentimento que isto não vai resultar", ou "eu na altura bem avisei de que"...)
E não acaba aqui.